Ohh...no, as abóboras de novo!
Para se ter uma ideia dessa obsessão pelas abóboras, no meu primeiro outono em Lilliput, em 2016, fomos convidados para uma festa na escola da Petite: a famosa pumpkin party. Quando eu cheguei ao local, completamente desavisada, havia uma sala lotada de abóboras e de apetrechos (espátulas, facas, moldes) e a professora me explicou, efusiasticamente, que era uma competição entre as famílias para ver qual criança faria a lanterna mais assustadora. Sob pressão, a novata família brasileira ganhou o primeiro lugar! E, até hoje, eu me pergunto: como? Tenho para mim que foi carta marcada, apenas para nos fazerem sentir mais integrados... E, no final, nossa laterna ficou o mês todo afixada num cartaz no corredor da escola. Inesquecível: sorte de principiante!
Naquele mesmo outono, fui fazer uma aula de culinária italiana em Basel, e quais eram os pratos a serem ensinados? Sopa de abóbora com gengibre e biscoitos de Halloween (aqueles dedinhos de bruxa e tabuleiros de fantasmas e esqueletos)... Italianíssimos, não?
Depois, esse ano, o comitê das esposas que organizam as boas-vindas às expatriadas sugeriu uma visita à fazenda que vende abóboras na região de Basel... E, sábado passado, não tive escapatória: Didier e Petite estavam alvoroçadíssimos para visitarem a tal fazendinha e degustarem a culinária da abóbora (na sopa, no assado, na torta, no muffin, etc.) e escavarem as suas Jack’o Lanterns.
Essa sucessão de fatos foi se avolumando na minha mente: afinal o que havia por trás desse panorama, e por que aquilo me incomodava tanto? Hoje, eu pondero que o que me inquieta mais nessa estória toda é que a abóbora acaba sendo associada a um sentimento nostálgico, e extremamente romantizado da época em que pequenas famílias de fazendeiros se reuniam em torno do período da colheita para agradecer à safra que os tiraria da penúria em que viviam; e esse retorno ao passado, a qualquer custo, me soa artificial e dissimulado. Principalmente, num país onde, há quase 30 anos atrás, se deu dimensão mundial à tecnologia world wide web (www); e no qual a indústria química e farmacêutica é um dos maiores impulsionadores do crescimento econômico.
Enfim, eu adoro as lendas e o folclore, e acredito que as tradições devam ser resgatadas e transmitidas de geração à geração, mas sem exacerbação, sem a pumpcking crazy culture.